sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Sem perder a vaidade, Joice Silva vive para luta olímpica e se emociona por 2016

Bicampeã sul-americana enfrenta rotina dura de treinos para corresponder a expectativas de dirigente e técnico por medalha nos Jogos de Londres

O cabelo já estava arrumado. A roupa também foi trocada e está pronta para encarar mais um dia de suor e esforço. Sem perder o charme e a vaidade, Joice Silva chega à academia na zona norte do Rio de Janeiro e chama a amiga para iniciar a atividade física com ela. Mas o treino da atleta de 26 anos não é nada fácil. Após mais de três horas de puxões e quedas sonoras, o rosto de menina e o sorriso constante dão lugar à raça e ao empenho da octacampeã brasileira e medalhista de ouro sul-americana por duas vezes, considerada futura dona do título mundial da luta olímpica.

- Existe um estereótipo de que todo lutador é mal encarado, emburrado. Sempre que eu conto o que faço, me respondem: “Sério? Nem parece!”. Nunca percebi nenhum tipo de preconceito por eu ser mulher em um ambiente que parece violento. Mas isso também não me afetaria – diz a carioca, que foi a sétima colocada no Mundial da Dinamarca, disputado em outubro.

Dedicada aos treinos da modalidade, que tem como objetivo tornar se mais popular, Joice conta que seu talento foi “quase natural”. A lutadora praticava jiu-jítsu em um projeto social em uma comunidade do Rio de Janeiro e foi chamada para conhecer a luta olímpica. E, em sua primeira competição, há sete anos, ela já foi campeã. O bom resultado motivou a atleta a querer sempre mais dentro do esporte.

- Vivo em função do treino. Acordo, arrumo a mochila e levo uma hora no ônibus até chegar à academia. Almoço e descanso aqui mesmo para, logo depois, treinar mais a parte física, com musculação. Depois disso, vou para casa e, às vezes, dá tempo de entrar na internet e conversar com os meus amigos. Mas o que gosto mesmo é ficar assistindo a vídeos de luta para aprender mais. Faço o que gosto – conta.

A satisfação que Joice demonstra nos treinos também comove seus companheiros de equipe e dirigentes da luta olímpica, que já vêem nela o futuro da modalidade no Brasil. Representante do país no Pan-Americano de Indianápolis (1987), Roberto Leitão é superintendente da Confederação Brasileira de Luta Olímpica e aposta na carioca como medalhista nos Jogos de Londres-2012.

- Joice não é mais uma promessa, é uma realidade. Tem ótimos resultados, já se firmou entre medalhistas do Pan e tem o domínio nacional há alguns anos. Não é segredo, é dedicação. Ela é a mais dedicada daqui. Não falta treino, chega mais cedo, vive para isso. Acho que este é o ciclo dela. No último Mundial, ela já fez lutas duríssimas contra as melhores do mundo e, a qualquer momento, vai chegar a vez dela sentar no trono – disse o ex-lutador da categoria até 90kg.

Joice também acredita no seu potencial. No entanto, a lutadora se vê no pódio olímpico apenas nos Jogos do Rio de Janeiro-2016. E quem pensa que ela lamenta isso, se engana. A carioca quer que sua conquista aconteça em casa, num lugar que “todos falem a sua língua e entendam o que aquilo representa para ela”.

- Cheguei a um nível em que apenas detalhes fazem a diferença. E eu quero acabar com eles o quanto antes. Meus planos são classificar para Londres e chegar bem lá para vir para o Rio-2016 para medalhar. Quando soube que os Jogos seriam aqui, fiquei muito feliz. Chego até a me emocionar quando falo sobre isso. Já me imagino lá no primeiro lugar, chorando, com a medalha de ouro no peito, e sendo aplaudida por todo mundo. Vai ser muito bom ter a minha família comigo nessa hora. Sonho com isso – revela, lembrando que as Olimpíadas classificam apenas 20 atletas por categoria.

Força dentro do tatame e coração mole fora dele

Os resultados na luta olímpica podem exemplificar o talento de Joice Silva para o esporte. Mas, fora da modalidade, é com os amigos e técnico que ela percebe outras qualidades. Susana Almeida, companheira de treinos diários, elogia a personalidade da carioca e revela um fato curioso que sempre presencia.

- Ela é muito mãe, um exemplo para mim. Se fico triste, ela me incentiva a levantar e ir lutar. E nunca reclama de nada, principalmente com comida. Tudo o que ela prova, está sempre ótimo. Pode estar horrível, que, para ela, estará maravilhoso. Ela agrada a todas as cozinheiras do Brasil (risos) – entrega a amiga.

Presente na vida de Joice desde sua iniciação na luta olímpica, o técnico Marcos Paulo conta como é conviver diariamente com a atleta em uma relação mestre e aprendiz e tem grandes expectativas para ela.

- Treinar a Joice é muito fácil. Ela é excepcional, obediente, educada, alguém que responde aos seus princípios. As expectativas são as maiores possíveis, vejo nela uma futura campeã mundial. Queremos nos posicionar logo em Londres entre os 10 melhores e, em 2016, nas nossas Olimpíadas, virão as medalhas, com certeza – afirma.

Consciente de tudo que conquistou através da luta olímpica, Joice pretende retribuir em breve. A atleta se formou em educação física com bolsa de estudos adquirida por sua passagem por um projeto social e quer dar as mesmas oportunidades a outras crianças.

- Penso em dar aula, ensinar o que eu aprendi. Mas não quero apenas formar atletas, mas grandes cidadãos. Acredito na educação pelo esporte. Se mais crianças tiverem a chance que eu tive, elas podem mudar o futuro delas.

Reportagem publicada no Globoesporte.com
<06/11/09 - 10h10 - Atualizado em 06/11/09 - 10h46>
Mariana Kneipp e Thiago Correia

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